O direito de família é
um ramo da ciência jurídica que sofreu modificações no último século e em
evidência em todo o mundo ocidental. Tais mudanças são decorrentes do declínio
do patriarcalismo cuja derivação ideológica é a Revolução Industrial e
Revolução Francesca que marcaram um novo ciclo histórico: A Idade
Contemporânea.
Essas mudanças, especialmente nos
costumes e na “liberação sexual”, começou-se a pensar que a família entrou em
crise, em desordem. As constantes
mudanças no processo histórico contribuem para que as mesmas não sejam vistas
com bons olhos. É natural que em meio a este contexto histórico, e que ainda
estamos vivenciando, tenhamos um olhar medroso e pessimista às mudanças. É
compreensível que as coisas novas amedrontem, mas o processo é de evolução
histórica e não de decadência. As turbulências do caminho são decorrências
naturais.
Atualmente o Direito de Família
contempla novas e plurais famílias com configurações singulares desenvolvendo-se
para a superação de valores e impasses antigos. Todas
as mudanças na estrutura da organização familiar, cujas raízes vinculam-se ao
declínio do patriarcalismo, significam, também, o ápice das rupturas de um
processo de dissociação iniciado há muitos séculos.
A resignação histórica das
mulheres é que sustentava os casamentos. O fantasma do fim da conjugalidade foi
atravessado por uma realidade social, em que imperava a necessidade de que o
sustento do laço conjugal estivesse no amor, no afeto e no companheirismo. Aí
reside uma das mudanças paradigmáticas e estruturantes do Direito de Família: a
família deixou de ser essencialmente um núcleo econômico e de reprodução.
Em outubro de 1988, com
a Constituição da República Federativa do Brasil, ficaram consagrados os
princípios fundamentais para o ordenamento jurídico brasileiro. Foi uma
verdadeira revolução. Foi a partir dessa revolução constitucional que se
consolidou toda a evolução do Direito de Família, e que emergiram os princípios
fundamentais para a organização jurídica da família.
De imediato faz-se necessário mencionar O princípio da dignidade da pessoa humana, sendo esse princípio como fundamento da República,
a Constituição Brasileira deu maior valor à proteção da pessoa
humana, garantindo o exercício e o reconhecimento de sua condição, sem nenhuma
discriminação na sociedade em que vive.
Ressalta Ingo Sarlet, ao
expressar a noção de pessoa, como sujeito de direito e obrigações:
Com fundamento na própria dignidade da pessoa
humana, poder-se-á falar também em um direito fundamental de toda pessoa humana
a ser titular de direitos fundamentais que reconheçam, assegurem e promovam
justamente a sua condição de pessoa (com dignidade) no âmbito de uma
comunidade. Aproxima-se desta noção – embora com ela evidentemente não se
confunda – o assim denominado princípio da universalidade dos direitos
fundamentais.
Atualmente, não é mais possível falar de direitos, desatrelados da ideia
de dignidade, que funciona também como o vértice do Estado Democrático de
Direito, pois é o pressuposto da ideia de justiça humana. Embora a noção de
dignidade já fosse um princípio não expresso no ordenamento jurídico
brasileiro, tornou-se um princípio expresso somente com a Constituição da
República de 1988.
É impensável, hoje, qualquer julgamento ou concepção em Direito de
Família desatrelados ou destituídos da noção ou ideia de dignidade. Ela
funciona como um macroprincípio, ou superprincípio que dá a base de sustentação
dos ordenamentos jurídicos.
No Direito de Família, em particular, é o princípio que sustenta e paira
sobre todos os outros princípios. É ele que permitiu incluir todas as
categorias de filhos e famílias na ordem jurídica.
A dignidade humana só pôde ser expressada na Declaração Universal dos
Direitos Humanos (1948) e depois espalhada e consolidada nos ordenamentos
jurídicos em geral, porque é fruto e consequência dos movimentos políticos e
sociais, mas também por influência do discurso psicanalítico que introduz e consolida
as noções de sujeito, alteridade e desejo, que possibilitam desconstruir um
discurso do sujeito alienado à moral sexual e à moral dominante e excludente.
Para ser sujeito da própria vida e “senhor de si”, entre outros senhores
de si, é necessário apropriar-se de seu desejo. A dignidade humana pressupõe,
entre outros requisitos, não estar assujeitado ao desejo do outro.
Outrossim, temos o princípio do
melhor interesse da criança/adolescente significa o assento e a consolidação de
uma mudança paradigmática. É este princípio que autoriza e dá sustentação, por
exemplo, para que a guarda dos filhos esteja com aquele que tiver melhores
condições psíquicas para cuidar dos menores, independentemente de ser o pai ou
a mãe biológica. É este princípio, associado à dignidade e ao princípio da
afetividade, que fez nascer novos institutos jurídicos como a guarda compartilhada
e a parentalidade socioafetiva.
Na
Convenção Internacional dos Direitos da Criança, adotada pela Assembleia Geral
das Nações Unidas no dia 20 de novembro de 1989 e ratificada no Brasil em 1990,
consagrou no artigo 3º, I, que:
Todas as ações relativas às crianças, levadas a
efeito por instituições públicas ou privadas de bem-estar social, autoridades
administrativas ou órgãos legislativos, devem considerar, primordialmente, o
interesse maior da criança.
Busca-se através deste princípio, dizer que o
interesse da criança nas relações familiares é de extrema importância, devendo
dar mais ênfase nas vontades, condições de vida, ambiente físico e mental do
menor, etc., pois se tratando de pessoas em desenvolvimento, possuem condição
prioritária e proteção não apenas da família, mas do Estado e da sociedade.
A proteção à dignidade da criança e do adolescente
e a liberdade de expressar sua vontade, permite a construção pela convivência
de relação afetiva do menor com aqueles que se considera como pais, mesmo não
existindo consanguinidade, autorizando o reconhecimento jurídico da paternidade
socioafetiva.
O princípio da pluralidade das formas de
família é o
aspecto família veio se modificando ao longo do tempo,
trazendo mudanças sociais importantes dentro de uma relação familiar. A atual constituição contribuiu muito nesse pluralismo
trazendo novos modelos de família.
Além da família matrimonial, a Constituição considera também as constituídas pela
união estável entre o homem e a mulher e as monoparentais, aquelas formadas por
apenas um dos pais e seus descendentes.
Na
brilhante fala da socióloga e psicanalista carioca, Marlise Matos:
“Seres humanos são
uma espécie de matéria ou energia que produz ligação e desligamento, vínculos e
rupturas e é das vicissitudes entre esse caldeirão de forças que construímos a
nossa própria história individual. Ser heteroerótico ou homoeróticamente
orientado no percurso de construção de nossa história pessoal é um resultado
que, para mim não precisa vir acompanhado de um julgamento valorativo” (MATOS
Marlise. Reinvenções do vínculo amoroso, p. 140).
O princípio da Afetividade liga as pessoas
pela afeição, ou seja, a vontade de querer constituir uma família com base em
uma convivência. O princípio da afetividade não se encontra expresso, mas está
de forma implícita na constituição como um elemento inspirador da
família, onde as pessoas devem ter comunhão de vida e estabilidade nas relações
afetivas.
A mulher passa a ser independente do marido, fazendo com que a família
se reúna com base no afeto, na vontade de formar um conjunto, distanciando
daquele casamento subordinado, onde a mulher casava-se por questões econômicas
e de sobrevivências.
Para Rolf Madaleno:
“O afeto é a mola
propulsora dos laços familiares para dar sentido e dignidade à existência
humana. Nos vínculos de filiação e parentesco a afetividade deve estar sempre
presente, pois os vínculos consanguíneos não se sobrepõem aos liames afetivos,
ao contrário, a afetividade pode sobrepor-se aos laços consanguíneos.”
Hoje já
não mais se aceita o Direito de Família sem o afeto, diz Daniella Velloso
Pereira e Maria Flávia Cardoso Máximo, pois o mesmo permeou as divisas do
direito e rompeu antigos paradigmas, alicerçando o conceito de família.
A afetividade se faz presente no Código Civil, dispondo no artigo 1511, que o casamento exige plena
comunhão de vida, tanto que cessada a convivência, mesmo que mediante apenas
separação de fato, termine o regime de bens.
A Lei
Maria da Penha (artigo 5º, II) e
o Estatuto da Criança e do
Adolescente (Lei 12.010/2009, acrescentado parágrafo
único ao artigo 25) também acolhem o princípio da afetividade.
Sendo assim, o princípio da afetividade
resulta da convivência familiar, de atos exteriorizados, de condutas objetivas
demonstrando o afeto familiar de seus membros na constituição e manutenção das famílias, capaz de gerar
vínculos jurídicos como a paternidade socioafetiva.

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