Testamento
Vital
O direito à vida é o primeiro grande direito
individualmente tutelado pela Constituição Federal, por ser a base de todo e
qualquer direito ou garantia do ser humano.
A dignidade da pessoa humana, por sua
vez, é um dos fundamentos do Estado brasileiro, e tem como fim precípuo a
tutela de todo e qualquer indivíduo que venha a se sujeitar às normas
brasileiras, seja ele nacional ou estrangeiro podendo superar a própria vida,
atingindo a morte. A partir do momento em que não se pode mais viver com dignidade, cada ser humano tem direito
a uma morte digna, à conclusão de sua vida da forma menos dolorosa e mais
íntegra possível, perto de quem se ama e da forma como se pretende. Esta morte
digna tem sido objeto de intensas e incessantes discussões no direito
brasileiro, eis que as práticas normalmente utilizadas para se pôr fim à vida
de um indivíduo são vedados pelas nossas leis.
De acordo com Flávio Tartuce, o
testamento é:
“negócio jurídico unilateral, personalíssimo e
revogável, pelo qual o testador faz disposições de caráter patrimonial ou não, para depois de sua morte”.
Por ser ato individual e personalíssimo, não
se admite testamento em conjunto ou por procuração, sob pena de nulidade do
ato.
O Código Civil brasileiro contempla
três formas comuns ou ordinárias de testamento: o testamento público, cerrado e
o particular; cada qual com suas particularidades, exigindo formalidades das
quais não se podem prescindir, sob pena de nulidade.
O
“testamento vital” é definido como um documento escrito, pelo qual uma pessoa
determina qual tipo de tratamento deseja ou recusa, numa situação futura, em
que possa estar acometido de doença terminal, que a impossibilite de manifestar
plenamente sua vontade.
A
Constituição Federal, ao outorgar, em cláusula pétrea, direito de liberdade a
todos os indivíduos, assegura não apenas as liberdades de expressão, de
religião, mas também, e principalmente, as liberdades sobre o seu corpo, sua
saúde e sua vida.
No Brasil, quanto aos atos jurídicos,
não vigora o princípio da tipicidade; assim os particulares detêm ampla
liberdade para instituir categorias de negócios não contemplados em lei, desde
que não haja afronta ao ordenamento.
Essa liberdade foi reconhecida pelo
Conselho de Justiça Federal, na V Jornada de Direito Civil, com o enunciado nº
527, que assim estatui: “é válida a declaração de vontade, expressa em
documento autêntico, também chamado ‘testamento vital’ em que a pessoa
estabelece disposições sobre o tipo de tratamento de saúde, ou não tratamento,
que deseja no caso de se encontrar sem condições de manifestar a sua vontade”.
Na justificativa apresentada para aprovação do Enunciado nº 527 explica-se que
o negócio jurídico que deve ser formalizado por testamento ou qualquer outro
documento autêntico - é possível valer-se desta disposição do art. 1.729, §
único para admitir qualquer documento autêntico no sentido de retratar as
declarações sobre o direito à autodeterminação da pessoa quanto aos tratamentos
médicos que deseja submeter ou recusa expressamente.
O novo Código de Ética Médica
(Resolução 1.931/2009 do Conselho Federal de Medicina), no seu art. 41, veda
expressamente ao médico abreviar a vida do paciente, mesmo a pedido deste
próprio ou algum familiar. Todavia, no seu parágrafo único dispõe que nos
casos de doença incurável e terminal, o médico deve oferecer todo tipo de
cuidado disponível, sem, no entanto, utilizar-se de ações diagnósticas ou terapias
inúteis ou obstinadas, considerando sempre o desejo expresso do paciente ou, na
impossibilidade, de seu representante legal.
Pelo exposto, não caracteriza ato
ilícito dispor acerca do tipo de tratamento aceito ou não em caso de doença
irreversível e terminal; até mesmo porque não se discute a abreviação ativa da
vida – eutanásia –, mas apenas expressa a recusa de terapias que não levem à
cura, prorrogando inutilmente um sofrimento pelo qual não se deseja passar.
Pretende-se, viabilizar a ortotanásia – que é a morte digna, sem intervenção
médica – afastando-se a distanásia – que é o uso de terapias e tratamentos inúteis
à cura do paciente.
Para a
elaboração das diretivas antecipadas de vontade, não é necessário que a pessoa
encontre-se com doença terminal no momento da declaração; basta que disponha no
documento sobre como quer ser tratada no futuro caso encontre-se inconsciente
por motivo de doença sem possibilidades de cura ou por decorrência de acidente
cujo trauma acarrete situação de morte iminente e irreversibilidade do quadro
clínico (chamada morte encefálica).
O art. 5º, II da Constituição
Federal, assegura a autonomia privada, pelo princípio da ampla legalidade,
segundo o qual: “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa
senão em virtude de lei”. Desse modo, todas as pessoas maiores e capazes são
livres para decidir sobre suas pretensões, expressando sua vontade desprovida
de qualquer coação, não dependendo esta pretensão de qualquer forma especial,
senão quando a lei expressamente exigir (art. 107, Código Civil).
Tratando-se o testamento vital de ato
decorrente da autonomia da vontade, tanto o Estado as quanto pessoas físicas ou
jurídicas de direito privado devem submeter-se a tais disposições, no sentido
de absterem-se de sujeitar o declarante a tratamentos e terapias inúteis.
Flávio Tartuce explica que a partir
da autonomia privada, que decorre dos princípios constitucionais da liberdade e
dignidade, admite-se a disposição de vontade no sentido de recusa a tratamentos
que gerem sofrimentos físicos e psíquicos, tratando-se de exercício admissível
da vontade humana.
Pelas considerações, verificou-se que
o testamento vital é juridicamente possível no Brasil, mesmo sem a existência
de legislação específica, desde que tratado como declaração de vontade e não
como testamento, observados os requisitos de existência e validade dos demais
atos e negócios jurídicos nos termos do Código Civil.
O princípio da dignidade da pessoa
humana fundamenta o direito a uma morte íntegra para qualquer pessoa. Aquele
que se encontra com doença incurável e esteja em sua plena consciência pode
determinar onde e como deseja passar seus últimos dias de vida.
Referência:
http://www.cartaforense.com.br/conteudo/artigos/testamento-vital-e-o-direito-a-dignidade/13080
Acesso em 12 de junho de 2018 às 15hs: 02min.

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